sexta-feira, 14 de março de 2014

O meu 25 de Abril (19)

Tinha entrado para o IST e após os incidentes iniciais, as coisas lá acalmaram um pouco, mas foi sol de pouca dura. Em breve a situação haveria de se complicar, mas agora não vou falar disso. Já lá iremos. Vou referir outro aspecto que muito contribuiu para a minha "emancipação", e ocorreu em 1971, que foi ter começado a trabalhar. Já tinha dado algumas explicações, coisas sem importância, mas a partir do inicio de 1971 constatei que na empresa onde o meu pai trabalhava, os CTT, abriam a possibilidade a filhos de funcionário que estivessem a frequentar a universidade de trabalharam à hora, quer como estudantes de engenharia assalariados, nas áreas técnicas, quer como "encaminhadores postais", nas estacões de CTT ou nas grandes centrais de distribuição ou separação de correio. Era assim que funcionava a "familia telegrafo postal", de que já aqui falei, e era uma medida positiva, embora matizada de algum paternalismo fascistóide, mas aproveitei. Inscrevi-me e tinha todas as condições, era filho de empregado, tinha 18 anos e era universitário. Assim comecei a trabalhar no dia 1 de Maio de 1971, pois o primeiro de Maio não era feriado, era um dia como os outros, a fazer 3 horas por dia, na Estação dos CTT do Terreiro do Paço, hoje Páteo da Galé, a ganhar 12 escudos por hora, todos os dias. Pelo menos até Outubro tinha um rendimento para o bolso, podia pagar os estudos e mais umas benesses por fora. Como "encaminhador postal" cobria necessidades não permanentes, isto é, férias, doença, maternidade, pelo que não havia garantia, e o trabalho no inicio consistia em "preencher o modelo 46", que era um livro onde se registava manualmente um a um, todos dados dos remetentes e destinatários de correio registado, aquilo que hoje são os utentes que fazem. Eram centenas de objectos postais, que se punham em fila e nós escreviamos no livro mod. 46, e só depois disso se podia expedir o correio. Era fácil embora chato e era uma coisa que os funcionários detestavam fazer... Mais tarde fui fazer outras coisa, incluindo atendimento ao público. Esta minha entrada permitiu, compatibilizando com as aulas, ganhar dinheiro, mas sobretudo um contacto com o mundo laboral real, e com muitos colegas universitários que também trabalhavam, o que permitia um óptimo convivio, grandes conversas, e muita consciencialização política, pois todos estavam a estudar e o ambiente em todas as faculdades era irrespirável. Acabei  por me manter neste trabalho alguns anos, de forma intermitente, até vir a ser funcionário efectivo, coisa que aconteceu em 1975, e da experiência lá vivida guardo fortes recordações, boas, muito boas e nenhuma má. Esta possibilidade abriu muitas portas do meu 25 Abril.

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